Há situações, porém, em que o processo de demissão pode gerar danos morais. Silva cita casos em que empregadores enviam mensagens padrão para diversos funcionários ao mesmo tempo, demitem fora do expediente ou negam qualquer possibilidade de diálogo.
— Uma mensagem como: "Você não serve para nada, pode se considerar fora da empresa", enviada por aplicativo, configura assédio moral. O mesmo vale para comunicações feitas em grupos de WhatsApp ou com cópia para colegas, e também para ironias, brincadeiras ou negativas de diálogo. O Judiciário tem sido rigoroso nesses casos — afirma.
A comunicação precisa ser inequívoca e formal, informando ao trabalhador os termos do desligamento e o pagamento das verbas rescisórias. Mensagens mal formuladas ou dúbias podem gerar conflitos
EDUARDO FELYPE MORAES
ADVOGADO
Veiga Lima reforça que a ausência de contato presencial pode ser um complicador, especialmente quando há dúvidas ou reações emocionais:
— O WhatsApp não é o melhor espaço para lidar com resignações ou discussões sobre o motivo do desligamento. Isso deve ser feito pessoalmente ou com acompanhamento do RH. A frieza da mensagem pode gerar a sensação de desprezo e desrespeito, especialmente se o trabalhador estiver em momento de fragilidade.
Especialistas pontuam que as empresas podem responder judicialmente sobre demissões comunicadas de maneira desrespeitosa.
— O Judiciário analisa o contexto. Mesmo que a demissão digital seja aceita, a forma como ela é feita pode configurar abuso de direito. O Judiciário tem valorizado o respeito à dignidade, a preservação da honra do trabalhador e a proporcionalidade no conteúdo das mensagens — conclui Silva.
Do ponto de vista psicológico, o impacto de uma demissão feita por WhatsApp ou e-mail pode ser profundo. Para a psicóloga Denise Milk, a forma da comunicação é tão importante quanto seu conteúdo.
— Quando o canal escolhido transmite frieza ou desconsideração, o desligamento tende a ser percebido como um ato abrupto, impessoal e desumanizado — afirma.
Sentimentos como humilhação, raiva, perplexidade e desamparo são comuns, principalmente quando não há acolhimento ou escuta. Em casos mais graves, podem surgir quadros de ansiedade e depressão.
A jornalista Jéssica Nascimento, 33 anos, ou por uma experiência de desligamento por WhatsApp durante a pandemia. Após avisar o gestor de que havia recebido uma proposta de outra empresa, foi surpreendida:
— Ele disse apenas que eu podia ar no RH pedir minha demissão e, em seguida, me bloqueou — relata.
Segundo ela, o problema não foi o aplicativo, mas a falta de respeito e humanidade no trato. Depois da demissão, ainda sofreu retaliações e tentativas de boicote em seu novo trabalho.
Embora exista uma percepção de que as novas gerações são mais habituadas a interações digitais, isso não torna os desligamentos frios menos dolorosos. A psicóloga Denise afirma que, independentemente da idade, o que machuca é a ausência de empatia:
— Um jovem pode até aceitar uma videochamada com mais naturalidade, mas não aceitará ser tratado como um número. O meio pode ser digital, mas a mensagem precisa ser humana.
Veiga Lima alerta que, apesar de digitais, as demissões seguem os mesmos princípios éticos e legais. Ou seja, mensagens ofensivas, desabonatórias, humilhantes ou enviadas em grupos da empresa podem configurar assédio moral.
— Parece absurdo, mas há casos em que o empregador demite alguém no grupo do WhatsApp da equipe. Isso é completamente inadequado e pode gerar condenações judiciais — adverte.
Ele destaca que o Judiciário analisa o conteúdo da mensagem com rigor. Se houver elementos que causem constrangimento ou ofendam a dignidade do trabalhador, é possível que a empresa seja responsabilizada.
— A demissão tem que ser clara, cordial e objetiva. E, de preferência, quando houver dúvidas ou resistência do trabalhador, o ideal é conduzir o restante do processo presencialmente ou com mediação adequada — afirma.
Ainda segundo a psicóloga, o modo como uma empresa desliga um colaborador pode causar um efeito silencioso e corrosivo nas equipes que permanecem.
— Quando o desligamento é mal conduzido, quem não foi demitido também se sente em risco. O ambiente se torna permeado por medo, desconfiança e cinismo. Isso mina a segurança psicológica e prejudica o engajamento e a retenção de talentos — explica.
Ela defende que todo desligamento, mesmo em ambientes mais formais ou remotos, deve incluir um mínimo de escuta, respeito e clareza.
— Isso não é frescura. É saúde relacional. É o que chamo de “psicodinâmica do encerramento”: o momento em que a pessoa organiza simbolicamente sua transição. E isso só acontece quando ela se sente minimamente acolhida — detalha.
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