Na prática, planos de saúde individuais saltaram, em média, de R$ 522,55 para R$ 707,59 (35,4% a mais) entre 2018 e 2022. Já os planos coletivos empresariais com até 29 pessoas subiram de R$ 539,83 para R$ 984,44 (acréscimo de 82,3%).
Para o Idec, a discrepância indica a necessidade de a ANS criar normas para os planos coletivos.
— No ano ado, tivemos reclamação de reajuste de 29% (em um ano). É algo que estamos acostumados e detectamos há muito tempo, porque os planos coletivos não têm um teto para aumento, então o reajuste varia muito de contrato para contrato — explica Marina Magalhães, pesquisadora do programa de saúde do Idec.
O instituto organizou uma campanha chamada Chega de Aumento no Plano de Saúde. Entre os pedidos estão a equiparação dos planos coletivos contratados por microempreendedores individuais (MEIs) a planos individuais, para que sejam contemplados com a limitação de reajustes.
Consideramos que é possível trabalhar com o pressuposto de negociação, mas defendemos que a operadora apresente a justificativa do cálculo do reajuste.
MARINA MAGALHÃES
Pesquisadora do programa de saúde do Idec.
Padronizar cláusulas de reajuste em todos os contratos coletivos e tornar obrigatória a apresentação completa do contrato coletivo para o consumidor são outros dois dos pedidos do Idec.
— Consideramos que é possível trabalhar com o pressuposto de negociação (entre operadoras e empresas), mas defendemos que a operadora apresente a justificativa do cálculo do reajuste. É comum, em contrato coletivo, a empresa negociar com a operadora e o funcionário não ter o ao contrato — comenta a pesquisadora.
Marina argumenta que a atuação mais efetiva da reguladora nos contratos coletivos poderia auxiliar o trabalhador a compreender melhor os motivos dos aumentos do setor.
— Na prática, quando o consumidor registra uma reclamação na ANS, a agência diz que não tem competência para resolver o problema por não regular os reajustes coletivos. Portanto, é importante uma regulação; sem isso, o consumidor fica sozinho: não adianta ele ficar esperneando para todos os órgãos, porque dificilmente vai ter alguma resposta positiva — acrescenta.
Para Giácomo Balbinotto Neto, especialista em economia da saúde e professor da Faculdade de Economia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a tendência de aumento nos planos de saúde está vinculada, em parte, à mudança do perfil da população. O envelhecimento do brasileiro e a melhora da expectativa de vida são exemplos citados pelo estudioso como decisivos para os custos do mercado.
— Há 20 ou 30 anos, a pessoa morria por conta de um problema cardíaco, de diabetes. Hoje, ela consegue conviver com isso, mas precisa ir com mais frequência a hospitais, fazer mais exames e ir ao médico mais vezes — resume.
Todos os anos são incorporados novos tipos de exames sofisticados, procedimentos robóticos e medicamentos caros: esses custos são incorporados ao preço dos planos
GIÁCOMO BALBINOTTO NETO
Professor de Economia da UFRGS
Além da busca mais frequente pelos serviços médicos, ele argumenta que o setor tem encarecido por causa da inclusão de tecnologias e processos judiciais de usuários.
— Todos os anos são incorporados novos tipos de exames sofisticados, procedimentos robóticos e medicamentos caros. As pessoas também judicializam o o a medicamentos e tratamentos: esses custos são incorporados ao preço dos planos — acrescenta.
Não há indicativo de que a situação mudará no futuro, pois é esperado que os custos da saúde continuem mais altos do que a inflação oficial do Brasil, projeta o professor. A situação pode piorar o sistema público:
— Há 42 milhões de pessoas nos planos de saúde coletivos; se 10% delas saírem, vamos ter consequência no custo para a saúde pública também. É bastante preocupante, pois o SUS já enfrenta dificuldades de filas e recursos — pontua o economista.
Por meio de nota à reportagem, a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) disse que os reajustes são reflexos do aumento dos custos médico-hospitalares, cuja variação é superior aos índices de inflação devido “aos níveis crescentes de utilização dos serviços de saúde e a incorporação acelerada de tecnologias”.
Infelizmente, a inflação médica é superior ao índice oficial do IPCA. Isso tem pressionado fortemente os custos das operadoras.
MARCELO DIETRICH
Diretor da Doctor Clin.
A entidade informou que, entre 2021 e 2023, o setor registrou prejuízo operacional de R$ 20 bilhões, “evidenciando um desafio financeiro extremamente significativo - as mensalidades hoje não são suficientes para o pagamento das despesas assistenciais”.
Por fim, a Abrange informou que não há previsão de quanto em média os planos de saúde subirão neste ano e que aguarda a consolidação dos números do setor no ano ado para projeções.
Marcelo Dietrich, diretor da Doctor Clin, reforça que os reajustes são necessários para a continuidade dos serviços.
— Infelizmente, a inflação médica é superior ao índice oficial do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo). Isso tem pressionado fortemente os custos das operadoras, obrigando o setor a rear esse aumento aos clientes para manter a capacidade de pagamento dos tratamentos pelas operadoras — diz.
Dietrich pontua que a Doctor Clin ainda avalia qual será o percentual de aumento neste ano, mas estima que o valor deverá subir em torno de 10%; o acréscimo poderá ter variação conforme o porte da empresa e o índice de utilização.
O diretor acrescenta que, nos últimos cinco anos, a Doctor Clin foi a operadora com os menores índices de reajuste nos contratos de até 29 pessoas na comparação com concorrentes locais; essa categoria foi a que teve o aumento mais significado no país segundo o estudo do Idec citado nesta reportagem.
Conforme Dietrich, a revisão periódica do rol de coberturas obrigatórias dos planos de saúde também pesa nos custos da saúde:
— A inclusão de novos medicamentos quimioterápicos, as terapias para tratamento de transtornos do desenvolvimento como o transtorno do espectro autista e a cobertura para algumas doenças raras são alguns exemplos. São novas obrigações para as operadoras, que ampliam e melhoram a cobertura aos usuários que precisam, mas isso impacta nas mensalidades de todos os clientes — pontua.
Observamos o comportamento agravado dos custos pelo aumento de frequência, novas tecnologias e novas inclusões no rol de cobertura.
MÁRCIO PIZZATO
Presidente do Conselho de istração da Unimed Porto Alegre
Márcio Pizzato, presidente do Conselho de istração da Unimed Porto Alegre, diz não ter uma estimativa de reajuste dos planos em 2024 porque, segundo ele, “cada contrato tem suas particularidades conforme a sua utilização, sinistralidade do período e especificidades acordadas”. O aumento será consequência de diversos fatores:
— Observamos o comportamento agravado dos custos pelo aumento de frequência, novas tecnologias e inclusões no rol de cobertura e a sinistralidade (uso do plano) se manteve elevada em 2023, o que afetou o mercado como um todo — explica.
Outro ponto destacado por ele é quanto às fraudes: Pizzato cita um estudo feito pela Ernst & Young e o Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), para explicar o problema:
— Estima-se que a cada R$ 100 faturados, R$ 12,70 são perdidos, de 12% a 18% das contas hospitalares apresentam itens indevidos e até 40% dos exames são desnecessários. É preciso mantermos olhar atento e esforços voltados para temáticas como custos, receita e despesas operacionais e manter a busca constante por uma maior eficiência da gestão para mantermos a sustentabilidade do negócio. Todos estes fatores impactam nas mensalidades.
No dia 8 de fevereiro de 2024, a Agência Nacional de Saúde enviou a seguinte resposta aos questionamentos da reportagem sobre o reajuste dos planos coletivos:
A fim de conferir transparência para a sociedade e aumentar a competitividade no setor, a ANS publica com informações sobre os reajustes de planos coletivos, contendo estatísticas centrais dos reajustes praticados pelas operadoras no período desde 2017 até novembro de 2023. Consulte O de Reajustes de Planos Coletivos. Clique aqui e saiba mais sobre o reajuste dos planos de saúde.
Sobre os percentuais que serão aplicados aos planos de saúde em 2024, a ANS informa que não faz previsões. O índice máximo que a ANS definirá para os planos individuais será calculado após o recebimento de dados que as operadoras enviarão à Agência até o fim do mês de março. A previsão é que a divulgação aconteça até o mês de junho.Os percentuais aos planos coletivos são informados posteriormente à Agência pelas operadoras.