
Pesquisador da história de Santa Lúcia do Piaí, Éder Dal’Agnol dos Santos compartilha com a coluna a saga do menino Geraldo Ceconi, bastante conhecida entre os familiares. As informações a seguir foram obtidas a partir de entrevistas de Éder com as senhoras Vilma Ceconi Cavinato, 74 anos (irmã de Geraldo), Gema Cavalli Lazzarotto, 89, e Terezinha Cavalli, 96 (tias).
Primogênito de Alessio Ceconi e Angelina Cavalli, Geraldo nasceu em 28 de junho de 1945, na Linha Santo Antônio, e, desde a infância, demonstrou ser diferente dos irmãos, devido à aguçada espiritualidade. Esse dom ficou ainda mais evidente após ele sofrer um acidente que mudaria sua vida – o garoto foi alimentar o cavalo da família e levou um coice na nuca, o que gerou um coágulo interno e posteriormente um tumor.
Como a família residia na localidade de Santa Terezinha, em Tunas Baixas, Geraldo ficou hospedado na casa dos avós maternos, João Vitório Cavalli e Páscoa Lazzarotto, na Vila de Santa Lúcia.
Vendo as fortes crises de dor de cabeça do sobrinho e sem muitas expectativas no hospital local, a tia Gema Cavalli Lazzarotto, atualmente com 89 anos, conta que marcou uma consulta em Caxias com o médico Darwin Gazzana. A solução? Uma cirurgia para a remoção do nódulo, na Santa Casa de Misericórdia, em Porto Alegre.
Conforme apurado por Éder, o procedimento foi realizado pelo Dr. Eliseu Paglioli, pioneiro da neurocirurgia no país. A operação, infelizmente, gerou graves sequelas no menino, e ele perdeu totalmente a visão.

UM SONHO
Devoto de Nossa Senhora, Geraldo contava várias histórias, principalmente para a tia Leopoldina Cavalli, que fazia seus curativos. Um de seus relatos foi sobre o dia exato em que ele iria morrer – previsão anunciada por Nossa Senhora em um sonho.
No início de 1959, durante uma forte crise, Geraldo pediu que assem água benta em sua cabeça e rezassem com ele. O pai, então, resolveu levar novamente o menino a Porto Alegre, acompanhado da cunhada Gema.
Antes de partir, porém, o menino comentou o sonho com a mãe e os irmãos. Nossa Senhora teria anunciado que ele iria falecer e que, antes de sua partida, voltaria a enxergar.

VELÓRIO EM CASA
Conforme recordado pela tia Gema Cavalli Lazzarotto, um dia antes do falecimento de Geraldo, o menino abriu os olhos e comentou que “estava enxergando e viu uma faixa azul nos azulejos do quarto”. Na madrugada de 15 de agosto de 1959, como previsto, Geraldo faleceu.
Gema, que estava com o menino antes da partida, disse que o sobrinho abriu os olhos, olhou para ela, fechou novamente e virou a cabeça para o outro lado. O pai também relatou que Geraldo, ainda no dia 15, comentou que Nossa Senhora iria buscá-lo – Alessio já tinha sido avisado pelo médico, horas antes, que o filho talvez não fosse ar daquela noite.
O menino foi velado primeiramente na casa do avô João Victório Cavalli, na Vila de Santa Lúcia, para que as crianças da escola onde ele havia estudado pudessem vê-lo. Da Vila, ele seguiu para a casa dos pais, na Linha São Paulo. Dona Gema recorda que a irmã exclamou:
“O que você veio trazer, meu filho morto!”.
PREMONIÇÃO
Em 1959, antes de ir para a cirurgia em Porto Alegre, Geraldo teve outra “visão” e comentou que viria buscar o pai. Após a partida de Alessio, ele iria levar também a mãe, com muitas flores.
Alessio Ceconi faleceu em 24 de janeiro de 1999. Angelina Cavalli Ceconi morreu apenas quatro meses depois, em 31 de maio.

GRAÇA ALCANÇADA
Toda essa história impulsionou a crença milagrosa em torno de Geraldo e de sua devoção à Nossa Senhora. Conforme destacado pelo pesquisador Éder Dal’Agnol dos Santos, no início dos anos 1960, dona Leopoldina Cavalli (1924-2022), tia materna de Geraldo, foi diagnosticada com nódulos cancerígenos na mama e teria pedido ao sobrinho, então já falecido, que intercedesse por ela.
Leopoldina visitou o túmulo do menino na Linha São Paulo, intencionando a graça e a cura. No dia da consulta, analisando os exames, o médico verificou que não constavam mais nas imagens os nódulos que seriam removidos.
Surpresa e agradecida pelo suposto milagre, Leopoldina desejava que o menino fosse reconhecido por este feito. Construiu, então, na casa do pai, uma capela/gruta em honra a Nossa Senhora, para homenagear o sobrinho.
É provavelmente do dia da bênção dessa capela, no início dos anos 1960, a imagem acima. Vemos a mãe do menino, Angelina Cavalli; o avô, João Victório Cavalli; a avó, Páscoa Lazzarotto Cavalli; o senhor Rodolfo Cavalli, Margarida Schiavo (parteira de Santa Lúcia), dona Leopoldina Cavalli, Terezinha Cavalli (a tia Tete), Neli Comunello Cavalli (esposa do fotógrafo Fiorentino Cavalli), com suas filhas Maria Lúcia e Fátima; Gema Cavalli Lazzarotto e o padre Roque Castellano.
O local é antiga propriedade onde a família morava, na então Vila de Santa Lúcia do Piaí.
SOFRIMENTO MAIOR
Em depoimento ao historiador Éder Dal' Agnol dos Santos, dona Terezinha, a tia Tete, relembrou de um diálogo com o sobrinho enfermo. Durante uma visita ao menino, na Santa Casa de Misericórdia, em Porto Alegre, disse a ele: “Que travesseiro duro foi dado para você, Geraldo”. Ele respondeu:
“Tia Tete, o sofrimento de Jesus foi maior”.
FRUTAS E PASTÉIS
Segundo relatos de dona Vilma Ceconi Cavinato, o sofrimento da mãe Angelina, após a cirurgia que deixou o filho cego, foi muito grande – todos da família sempre procuravam tratá-lo com mais carinho e afeto. Vilma recorda que sempre eram oferecidos ao irmão os melhores alimentos e as melhores frutas.
Certa vez, dona Angelina trouxe pastéis de Caxias, sendo o maior deles entregue a Geraldo. Mesmo sem enxergar, o menino perguntava por que era oferecido a ele sempre o maior. Emocionada, a mãe dizia que todos os pastéis eram iguais, retirando-se da casa para chorar no paiol na propriedade.

O CASARÃO EM TUNAS BAIXAS
Na imagem acima, o antigo casarão de João Victorio Cavalli, avô de Geraldo. Foi nesta propriedade, em Tunas Baixas, nas intermediações da Capela de Santa Terezinha – local conhecido como “buraco” –, que ocorreu o incidente com o menino.
Conforme destacado por Éder, com a mudança da família de João para a Vila de Santa Lúcia, Geraldo e os pais, Alessio e Angelina, deixaram a Linha Santo Antônio e aram a residir ali – com o intuito de cuidar dos animais e do moinho que abastecia a comunidade. Na foto vemos o casal João Victorio Cavalli e Páscoa Lazzarotto Cavalli com os filhos defronte à propriedade.
Vale saber: o casarão é habitado atualmente pelo senhor Oswaldo Scopel, sobrinho de João Victorio. Oswaldo é filho de Maria Cavalli e Aquilino Scopel, que adquiriu a casa quando Victorio mudou-se para a vila. Oswaldo é irmão gêmeo do padre Mário Scopel, atual pároco de Santa Lúcia do Piaí.